Participação na consulta pública do PAEC - Plano de Acção para a Economia Circular 2023/2027
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Participação na consulta pública do PAEC - Plano de Acção para a Economia Circular 2023/2027

Participação na consulta pública do PAEC - Plano de Acção para a Economia Circular 2023/2027

INTRODUÇÃO

Numa perspectiva decrescentista, que não é de recessão nem de austeridade, ficaram esquecidas neste PAEC, nomeadamente o Relatório Meadows, as constatações do IPCC, a Conferência “Beyond Growth”, e sobretudo a não referência aos modos de como se fará a transformação da sociedade no seu todo.

Também não se encontram valorizadas e materializadas as noções de (de)crescimento e produção, respaldadas na possibilidade de dissociação do crescimento económico da utilização de recursos/pressões ambientais, e sobretudo a ausência duma visão “post-growth”.

Para compreender um pouco melhor esta matéria, identificam-se pontos relativos aos antecedentes, e analisam-se alguns dos aspectos centrais em discussão.

ENQUADRAMENTO

Na política, na economia, na sociedade e na cultura, o humanista aponta para o sentido da responsabilidade e da justiça, obrigando a repensar, denunciar, atualizar e reprojetar em permanência, com base em observações atentas e reflexões críticas apuradas, no diagnóstico sinóptico e arguto dos problemas e dos vícios de que enfermamos.

Como poderemos reformar o mundo com os recursos que temos e com capacidade para assumir responsabilidades perante as gerações futuras? Esta interrogação reclama, no fundo, a liberdade e a responsabilidade, a dignidade e o respeito.

A dinâmica demográfica e de desenvolvimento económico provocará uma maior procura de recursos naturais, originando um aumento das emissões de gases com efeito de estufa (GEE), de poluentes para o solo, água e ar, e de resíduos gerados aquando da extração, manufactura, uso e fim de vida dos produtos.

Esta tendência económica está a criar uma enorme pressão na disponibilidade dos recursos naturais, gerando um contexto de extrema volatilidade, pelo que persistir num modelo de desenvolvimento linear teria como resultado a escassez do capital natural, social e financeiro.

É urgente alterar os padrões de consumo e aumentar, até 2050, entre 4 e 10 vezes a eficiência na utilização dos recursos. Assim, é necessária uma mudança do modelo de desenvolvimento económico linear para um outro mais concordante com os padrões de desenvolvimento sustentável e eficiente em termos de recursos, assumindo o “fecho de ciclo” dos produtos, conceito basilar da economia circular.

O modelo de economia circular assenta, de forma universal, numa melhor gestão dos recursos, na redução da extração e dos desperdícios, recusando, repensando e reduzindo padrões de dispêndios desnecessários, mantendo os materiais e recursos em circulação durante um período de tempo mais longo, preservando o seu valor e evitando esbanjamento.

RELATÓRIO MEADOWS - LIMITES DO CRESCIMENTO (1972)

O relatório ‘The Limits to Growth’, publicado em 1972, através de um modelo computacional baseado na teoria de sistemas dinâmicos, preconizou que sem mudanças substanciais do sistema vigente, o crescimento exponencial da população, da produção alimentar e industrial, e da poluição, conduziriam ao esgotamento dos recursos materiais e ao declínio abrupto das sociedades industriais na primeira metade do século XXI, conclusões que estão a ser corroboradas pelos dados reais dos últimos 50 anos.

É indispensável realçar o aspecto fulcral do sistema socioeconómico dominante que está dependente do crescimento exponencial do PIB, o que implica, por sua vez, uma expansão acelerada da produção e do consumo de bens e serviços, em clara incompatibilidade com os limites biofísicos.

ECONOMIA CIRCULAR

Em 2015, a Ellen MacArthur Foundation (EMF) definiu “a economia circular como uma economia que providencia múltiplos mecanismos de criação de valor dissociados do consumo de recursos finitos”.

O objetivo geral da economia circular assenta, assim, na redução da extração e do desperdício de recursos, a fim de dissociar o crescimento económico do aumento do gasto em recursos naturais, mantendo o desenvolvimento económico dentro dos limites do planeta.

A aplicação dos princípios subjacentes à economia circular tenta assegurar o cumprimento das metas ambientais e socioeconómicas preconizadas na Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, adoptada por todos os Estados-membros das Nações Unidas em 2015, e que contempla os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS),

PAEC - EUROPA

Em 2015, a Comissão Europeia propôs um conjunto abrangente de ações legislativas através da Comunicação “Fechar o Ciclo – Plano de Ação da UE para a Economia Circular”, que visava promover a transição da economia europeia de um modelo linear para um modelo circular.

Em 2019 foi publicado o Pacto Ecológico Europeu, que constitui um roteiro ambicioso para uma economia circular com impacto neutro no clima, e onde se previa a adoção de um 2º Plano de Ação para a Economia Circular, que incluísse uma iniciativa em matéria de produtos sustentáveis com um enfoque especial nos setores com utilização intensiva de recursos, como os têxteis, a construção e os plásticos.

Em 11 de março de 2020 é publicado o novo PAEC - UE, mais ambicioso e mais focado em todo o ciclo de vida dos produtos, e onde se preconiza um crescimento económico dissociado da utilização dos recursos, com o objetivo de reduzir as emissões de GEE em 55% até 2030 (em comparação com os níveis de 1990).

PAEC - PORTUGAL

O PAEC em Portugal, preconizado no Programa do XXI Governo Constitucional, é um instrumento estratégico assente em conceitos de prevenção, redução, reutilização, recuperação e reciclagem de materiais e energia, os quais constam no Anexo à Resolução do Conselho de Ministros, nº 190-A/2017, publicada em 11 de dezembro.

Substituindo o conceito de «fim-de-vida» da economia linear por novos fluxos circulares num processo integrado, a economia circular é vista como um elemento-chave para promover a dissociação entre o crescimento económico e o aumento no consumo de recursos, relação tradicionalmente vista como inexorável.

Foi criado o Grupo de Coordenação do PAEC, previstas as suas competências, integrando representantes de todas as áreas governativas (mais de 30), e de acordo com a Resolução do Conselho de Ministros nº 108/2019, publicada em 2 de julho, identifica-se um conjunto de ações macro (ou estruturais), meso (ou setoriais) e micro (ou regionais/locais) a desenvolver até finais de 2020.

Os objetivos centrais são, disseminar os princípios de economia circular nas políticas governamentais, promover e facilitar a execução das orientações, e garantir a articulação e contributo nacional para as medidas constantes do PAEC da União Europeia.

Em Portugal têm sido igualmente desenvolvidos nos últimos anos diversas estratégias, planos e programas em diferentes áreas (Figura 4), que incluem medidas relacionadas com a economia circular e que, desta forma, têm potencial para contribuir para o desenvolvimento de uma estratégia nacional neste âmbito.

Os resultados, associados à implementação de medidas e ações, podem ser consultados no “Balanço das Atividades do PAEC e dos Resultados Alcançados entre 2018 e 2020”.

BREVES CONCLUSÕES

Os objetivos preconizados são ambiciosos e é significativo o esforço requerido para o seu cumprimento a todos os níveis, desde a necessária alteração de modelos e procedimentos de gestão, até ao esforço financeiro exigido à necessária adaptação e reconversão de tecnologias, passando pela questão central das promoções e alterações dos procedimentos humanos.

Os resultados efectivos são muitíssimo pouco conhecidos, e não tem sido matéria de ampla discussão pública.

Os contributos e actuação da Rede para o Decrescimento será a de mudar as nossas atitudes enquanto cidadãos, questionar as práticas dos utilizadores em alternativa às de consumidores individuais ou institucionais, construir outras direções aos comportamentos e modos de pensamento, recusando o dispêndio de produtos desnecessários, aprofundando a compreensão qualitativa do significado das atividades económicas nas suas relações com as nossas vidas e as nossas necessidades básicas, partilhando em vez de acumular, criar um mundo que não seja apenas sustentável, mas agradável e justo.

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