E quem se lixa é o mexilhão…
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E quem se lixa é o mexilhão…

A “transição verde” que a Europa, Portugal e todos os governos tanto querem é apenas uma tentativa de eletrificar um sistema altamente violento e destrutivo - e não de o mudar.
E quem se lixa é o mexilhão…

Quando se pede a um homem, que fez fama e fortuna na indústria fóssil, para gerir a Economia e o Mar, não se podem esperar milagres. O que António Costa Silva quer fazer no Mar, é apenas mais do mesmo. Numa sociedade dependente do crescimento económico, a Natureza nunca poderá ser tida verdadeiramente em conta - porque é dela que teremos de extrair  enormes quantidades de materiais para manter este sistema zombie e suicida a funcionar.

Senão, olhemos para o que quer realmente dizer “Mineração em Mar Profundo”. Muito resumidamente consiste em enviar mega máquinas (como as na figura em baixo) para um dos mais frágeis e tranquilos ecossistemas do planeta, remexer violentamente todo o solo e arrasar toda a vida que aí existe (i.e. levantando e destruindo toda a camada dos primeiros 30-50cm de profundidade, em vários campos de centenas e centenas de campos de futebol). O único objetivo: extrair minerais que aí existem e que demoraram milhares de anos a formar-se.

Depois trituram esses minerais  in loco, enviam-nos para um barco à superfície e voltam a espalhar as poeiras desses sedimentos com milhares e milhares de anos na camada média do oceano - em nuvens imensas (por vezes com centenas de kms) de micropartículas muitíssimo agressivas - leia-se mortais - para tanta da vida no oceano. Para além de que se arrasa com um dos maiores captadores de carbono do mundo - o fundo do mar. Soa familiar?

É porque é. Parece uma cópia directa, quase anedótica, do processo de extração petrolífera, desta vez vestido de “verde”, já que é para fazer carros e outras coisas eléctricas - que neste momento são apontados como a solução para tudo. É o mesmo raciocínio para a exploração de gigantescas minas que querem abrir por todo o Portugal e pelo mundo. É assim, porque é assim. E se não percebermos somos uns palermas, porque o que é preciso é crescer e fazer mais dinheiro. Que importam uns bichos que nunca vimos, num lugar onde nunca fomos, e que não contribuem em nada para a riqueza do país? - exceto se for destruído, claro!

Ou seja, a “transição verde” que a Europa, Portugal e todos os governos tanto querem, não é verde de todo. É apenas uma tentativa de eletrificar um sistema altamente violento e destrutivo, não de o mudar. E, enquanto insistirmos em não procurar verdadeiras alternativas sistémicas a um modo de vida baseado no crescimento económico, sempre e a todo o custo, as únicas “soluções” que vamos encontrar, são estas. E é por isso que acabamos com Costas Silvas à frente de pastas como o Mar: porque são os melhores a fazer mais do mesmo - e é isso que se quer.

E, porque o problema não é apenas o das emissões de CO2, mas também o da destruição massiva e continuada de todo o tipo de equilíbrios e ecossistemas, em nome das necessidades básicas de todo o tipo de indústrias (é escolher), a solução não pode ser apenas técnica. I.e. nem o hidrogénio, nem o nuclear, nem as “renováveis” são soluções ou “apostas ganhadoras”. E não, a solução também não são baterias de um outro material qualquer. Não se duvida que o “génio humano” pudesse realizar cada uma destas proezas. Mas enquanto o fizer apenas com o objetivo de crescer economicamente (mantendo os níveis de consumo energético e material actuais), a destruição inerente à extração que isso implica (para construir todas as máquinas, e cadeias de distribuição, e embalagens, e etc de todas as coisas novas e digitais que isso vai permitir vender) faz com que o caminho em direcção ao abismo seja ainda mais direto. Enquanto as “soluções” apenas visarem a manutenção deste insustentável modo de vida, literalmente “ligado às máquinas” industriais  (como as de mineração de mar profundo, mas também de outras minerações, de agriculturas e agropecuárias industriais e intensivas, etc), continuaremos a “jogar como nunca, e a perder como sempre”.

É com base nesta ideia que a Rede para o Decrescimento em Portugal (parte de uma alargada rede internacional com o mesmo foco), trabalha, ativa e descentralizadamente, em busca de soluções alternativas, mas realistas e exequíveis. Fazemos perguntas difíceis em busca de novos modelos sociais, democráticos, económicos, tecnológicos, geopolíticos, alimentares, produtivos, de solidariedade e comunitários de pós-crescimento. As respostas por vezes assustam, mas não pode haver coragem sem medo. E o mundo que daí floresce é infinitamente mais criativo e coerente do que este que somos obrigados a engolir, ridicularizados quando ousamos (sugerir) pensar diferente. Mas vale a pena! E fica o convite.

Com a conferência dos Oceanos a chegar, juntamo-nos a quem faz o possível hoje, e continuamos a desenhar os “hoje-impossíveis” de amanhã. Junte-se a nós!


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